domingo, 10 de fevereiro de 2013

Entrevista

Sobre o tema acima, leia a entrevista com David Fleischer Cientista político da Universidade de Brasília

ENTREVISTA

"É a política ao pé do ouvido"

Professor emérito da Universidade de Brasília (UnB), o norte-americano David Fleischer estuda a composição dos plenários do Congresso desde a década de 1980. A bancada nordestina na Câmara foi tema de um de seus primeiros artigos científicos, em 1983. Abaixo, leia a síntese da entrevista concedida por ele a ZH.

Zero Hora — A chegada de dois políticos do Nordeste às presidências do Senado e da Câmara é uma coincidência?

David Fleischer — A simultaneidade pode ser uma coincidência, mas há, sim, um fato histórico envolvido. Desde a República de 46 (período histórico entre a renúncia de Getúlio Vargas e o golpe militar de 1964), a tradição é, do Sul, despontar líderes do Poder Executivo e, do Nordeste, do Legislativo. São diferentes tipos de liderança. Enquanto os políticos do Sul se destacam pelos discursos, pelas administrações, os do Nordeste são mais afeitos à negociação. É a política ao pé do ouvido. No que os mineiros, sejamos justos, são muito bons também.

ZH — E esses perfis diferentes se devem a quê?

Fleischer — Das origens dos políticos. No Sul, a tradição é os políticos surgirem de ONGs, de associações, de sindicatos ou de dentro dos próprios partidos. No Nordeste, até por serem bancadas menores, ainda existe muito a tradição familiar envolvida. Para conseguir um favor, você deve falar com determinada pessoa de determinada família. As famílias Sarney e, mais recentemente, a Calheiros, são os melhores exemplos disso.

ZH — Há mais fisiologismo nas bancadas do Nordeste?

Fleischer — Sim. Embora ele exista em outros Estados, por lá é mais forte. São políticos muito voltados para as coisas dos seus redutos, então eles são mais propensos a uma troca de favores políticos em Brasília em nome disso. A justificativa é de que são Estados sempre muito carentes de recursos. Que enfrentam intempéries como a estiagem deste ano, que é muito pesada. Então, em nome de liberação de verbas, acaba acontecendo isso.

ZH — E quais são os resultados práticos para a região?

Fleischer — Tem aquela velha gritaria de que São Paulo, pela população, deveria ter mais deputados. Já o pessoal do Nordeste diz que, justamente por serem mais necessitados, precisam enquadrar os paulistas no Congresso. Só que aí eu questiono: há mais de 50 anos mecanismos como a Sudene (Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste) foram criados, extintos e recriados. Para onde isso levou a região? Mas eles mudam de assunto.

ZH — Nesse cenário, há espaço para a ascensão de políticos de oposição na região?

Fleischer — Está difícil ser oposição no Brasil inteiro, mas a dificuldade no Nordeste se deve também por uma estratégia bem pensada pelo Lula. Ele sofreu com um Senado com maioria de oposição no seu segundo mandato. Em 2010, ele se dispôs a entregar um Senado mais tranquilo a Dilma e focou demais a campanha em acabar com o DEM, o ex-PFL de Antonio Carlos Magalhães, no Nordeste. Deu certo. Mas vem aí uma eleição interessante se concorrer o Eduardo Campos (governador de Pernambuco, do PSB). Além de ser um tipo diferente de oposição, assim como Aécio Neves (senador do PSDB de Minas Gerais), ele tem o DNA do avô (Miguel Arraes, ex-governador de Pernambuco falecido em 2005).

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